A lei do Amor
- Vivemos no mundo. [Todos calaram o bate-boca]. E o mundo não é puro.
[Barba de quem não vê lâmina há
três anos, cara gretada de sol do deserto]. Continuou:
- E Deus, bem, talvez não exista. E se existir, pior ainda: não se
importa.
O Czar tinha uma [não surpreendente]
alergia por eleições. As primeiras de Amhitar ocorreram com o enfraquecimento
do regime estrangulado por guerra e revolução. A Primavera das Flores de Barro açambarcou o poder no país.
O nascente governo amhitariano queria:
indústrias; tecnologia; fios de telégrafo em todos os quilômetros quadrados do
território; alta produtividade agrícola; e também [diziam os eternos opositores]:
vida eterna; paz eterna; felicidade; amor e maçãs em calda para todos – e para
o próximo ano, de preferência para a próxima semana.
Inevitavelmente surgiu a ideia de
proibir a intimidade sem respaldo em amor verdadeiro. [O projeto de lei respectivo
(dizem) recebeu forte apoio das floriculturas e lojas de chocolates]. Levantou-se
então Nasiba Dalton, cuja idade [já próxima (fofocavam) dos cem] o respaldava teoricamente
pouco para uma matéria afeita a fogosos jovens. E disse o que pensava do mundo.
Calaram-se todos. O que não
impediu o avanço do projeto. Resolveu-se tudo de maneira amhitariana [a
meio-termo]: tornou-se lei o amor [espiritual e puro] obrigatório. Porém não
foi seguida na prática e um golpe de Estado logo derrubou o regime. Por causa
ou não da lei – é questão aberta.
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