Muros
O Xeque Zulfizar planejava uma
grande parede de pedras, torres e guardas na fronteira Noroeste frente aos 99
desertos do platô de Qyzylorda [e das tribos nômades que o habitavam].
Preocupações orçamentárias o desviaram
desse grandioso [e no entanto vulgar] projeto. A falta de dinheiro o obrigou à filosofia.
Pensou: o importante de uma muralha é dividir. Aqui estamos nós
[os civilizados] e lá estão eles [os bárbaros].
Invadiu a terra bárbara e dizem
os cronistas [com algum exagero] que
deixou poucas cabeças em cima de pescoços. Isso garantiu [enquanto perdurasse
a memória do medo] que ninguém de lá viria para cá. Foi a primeira parte.
Restava convencer os de cá a não irem
para lá [tarefa necessária, pensou o arguto Xeque, pois era o terror dos Bárbaros
que fazia o povo aceitar o terror (alegadamente menor) dos guardas, dos dervixes,
dos cortesãos e dele mesmo].
Traçou uma linha na areia e
bradou – Do lado de lá não há nada! [A
paisagem plana como chapa facilitou sua tarefa].
O Xeque virou ossos, e assim também
seus netos e os tatara-tatara-netos dos netos destes e ninguém se atrevia a [ou
queria] atravessar a linha.
Um homem [o célebre andarilho
Dasha Ulugbek] passou no lugar [no dia de hoje em ano discutível] para caminhar
além. [Já eram então simples lembranças as razões políticas que geraram a proibição].
Perguntaram-lhe Por que você quer ir lá?
Respondeu: Por que o Lá existe – e meteu o sapato [na verdade uma sandália] na
estrada, que nem havia.
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