O simples rejeitado
O Da absoluta simplicidade do Reino de Amhitar adentrou
[talvez lamentavelmente] o imaginário nacional. Escreveu-o o
cronista Abdul Al-Wazahari em uma série de tratados começados por
Do ou De [e o fato de tal sequência incluir títulos
como De como encher o estômago dos convidados com bobagens quando
se tem pouca comida ou De como puxar tranças de cabelos
quando se é criança (considerados não sérios) pouco tem feito
pela sua aceitação nos eruditos meios nos quais circula].
O tratado principia por imaginar o país como um terreno plano [no
qual imperam a falta de imaginação e a monotonia (diz o
autor em trecho particularmente odiado)]. Afirma que Alá ou a
natureza [a dúvida pertence ao próprio Abdul] resolveram por lei
ou pelo ócio preencher o vazio com uns [poucos] cursos d´água,
meia dúzia de montanhas [nada que se compare à beleza do Pamir
ou do Himalaia – afirma o quase ranzinza autor] e
principalmente, com um povo.
A Terra [e aqui se encontra a parte cruciante da obra] por gerar os
habitantes, os fez à sua semelhança: as mentes rasas como o
solo, os corpos retorcidos como as pedras, eis aí o nosso povo –
e com tal frase não isenta de dramaticidade barata Abdul fecha o
livro. Lembrado pelo resto de sua obra, o autor é compreensivelmente
esquecido por esta. Sua presença na lista de festas nacionais se
deve a decisão [não isenta de orgulho] do Comitê Central em 1961
que lhe assinalou o dia de hoje, afirmando que O país é maior
que as críticas.
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