segunda-feira, 11 de março de 2013

11 de Março

A Estátua


Relatos de caravaneiros desde o século V mencionam o Prodígio do oásis de Zarafshan. As estátuas eram feitas para se parecer com deuses ou generais. Naquela, a pessoa que a olhava se reconhecia a si mesma. Essa Estátua sou eu! Era o grito mais comum. Moças adolescentes, velhos perto de conhecer os bisnetos, bandidos, mercadores, colhedores de água em poços – cinco minutos de recolhida contemplação e aquela massa de pedra marmórea parecia se moldar – o nariz, a boca, os olhos, os desvios na coluna, as rugas, os sofrimentos, os desejos de loteria ou cura – tudo do contemplador estava ali.

Isso não necessariamente trouxe benefícios a Oksana Abumalik. O artesão tornado escultor teve de responder a julgamentos perante o Xamã e a sete Conselhos de anciãos, desde a de se ocultar para utilizar pessoas como modelo sem sua autorização até a de escapar dos trâmites estabelecidos de fazer arte.

Escapou de todas – até que inevitavelmente veio a alegação de conluio com poderes negativos. Somente o Mal Personalizado poderia realizar um prodígio daqueles. Oksana fugiu para o Ponto Euxino [a Enciclopédia da Ásia Central sem citar fontes estabelece o dia de hoje como data de sua fuga]. Sua obra teve menos sorte. Quebrada em quatrocentos e nove pedaços rigorosamente contados foi jogada no segundo ponto mais fundo do Balkash. Sobrou seu olho esquerdo [dizem] que parecia sorrir e piscar para todos os que olhavam [e fugiam espavoridos]. Esse detalhe quedou como lenda.

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