Fantasmas habitam todos os desertos – essa frase tão axiomática
quanto discutível previsivelmente também habita o Boletim de 1894 [na data de
hoje] da romântica Academia de Ciências
de Amhitar. Eles a utilizaram para introduzir as narrativas das vozes ouvidas
pelos caravaneiros na planície de Aqtöbe. [Iusya Marzhaffar descontrói essas histórias como mitos criados pelo medo. Java Kharlilah no seu Os Grandiloquentes Heróis não se mostra
tão seguro e chega a mencionar três bandoleiros do tipo Robin Hood que seriam os responsáveis pelas aparições fantasmagóricas.]
Além de histórias de gente
perdida no deserto, dos tais fantasmas só resta parte de uma inscrição talhada
em abeto e conservada no museu da cidade traidora de Tashkent – uma variação de
um subdialeto Bakhmar que o poliglota Gulhayo Mansur [discípulo do semilendário
Abdullaeva Behruz] traduziu como
Solitário, desesperado, farei na minha fraqueza o que os fortes não
fazem.
Essa frase compreensivelmente
saiu de vetustos círculos de intelectuais e ganhou as cantigas de ninar – babás
ameaçavam crianças com esse estranho monstro se não dormissem logo. Talvez pelo
conteúdo depressivo – fantasmas maus podem aterrorizar, mas quem se importa por
um ser sobrenatural que tem pensamentos tão confusos e que podem ter [vaga]
conotação inconformista? – essa inscrição esquecida na ala antropológica simbolize
a comemoração talvez mais fraca das efemérides de Amhitar.
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