terça-feira, 12 de março de 2013

12 de Março

A inscrição esquecida


Fantasmas habitam todos os desertos – essa frase tão axiomática quanto discutível previsivelmente também habita o Boletim de 1894 [na data de hoje] da romântica Academia de Ciências de Amhitar. Eles a utilizaram para introduzir as narrativas das vozes ouvidas pelos caravaneiros na planície de Aqtöbe. [Iusya Marzhaffar descontrói essas histórias como mitos criados pelo medo. Java Kharlilah no seu Os Grandiloquentes Heróis não se mostra tão seguro e chega a mencionar três bandoleiros do tipo Robin Hood que seriam os responsáveis pelas aparições fantasmagóricas.]

Além de histórias de gente perdida no deserto, dos tais fantasmas só resta parte de uma inscrição talhada em abeto e conservada no museu da cidade traidora de Tashkent – uma variação de um subdialeto Bakhmar que o poliglota Gulhayo Mansur [discípulo do semilendário Abdullaeva Behruz] traduziu como
Solitário, desesperado, farei na minha fraqueza o que os fortes não fazem.

Essa frase compreensivelmente saiu de vetustos círculos de intelectuais e ganhou as cantigas de ninar – babás ameaçavam crianças com esse estranho monstro se não dormissem logo. Talvez pelo conteúdo depressivo – fantasmas maus podem aterrorizar, mas quem se importa por um ser sobrenatural que tem pensamentos tão confusos e que podem ter [vaga] conotação inconformista? – essa inscrição esquecida na ala antropológica simbolize a comemoração talvez mais fraca das efemérides de Amhitar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário