A [não pouco estranha] história
de Abdullaeva Behruz começou hoje [dizem] no ano de 1701 dos hereges. E começou-a
dobrando uma esquina [na esquina não havia símbolos mágicos, sinagogas ocultas,
seitas canibalísticas ou mesmo um bordel símbolo do mal – apenas uma sonolenta
peixaria, o que (para os patriotas) cobre a história de encantadora banalidade].
Olhou para trás. E viu as costas
de um rapaz de seus 14 anos que, tendo dobrado à esquerda [enquanto Abdullaeva
escolhera a direita] se afastava. Parou, o rapaz também. O rapaz olhava para trás
– percebeu: ele era ele, dois.
Continuou e na próxima esquina virou-se
e viu outro rapaz, na verdade o mesmo [mas era outro] que também fizera uma
escolha diferente.
E assim na próxima, e depois na
outra. A chegar a casa assustou parentes, madrinhas e conhecidos ao abrir a
boca – e dela saíram sons de um exotismo que um vizinho viajado pensou
reconhecer: era um dialeto siamês do malaio.
Abdullaeva entendeu: por alguma
razão os deuses [se os deuses existissem] deram a ele a capacidade de se
dividir. E cada pedaço dele sabia uma língua. Abdullaeva [bradam seus
entusiastas] aprendeu 7.777 línguas [outros dizem que sabia 11.112]. Quanto à
história, o linguista às vezes calava sobre ela, às vezes dizia que era falsa e
que, para aprender muitas línguas era preciso estudar meio século e 88 dias – método
que [compreensivelmente] não teve muitos seguidores.
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