quarta-feira, 16 de outubro de 2013

16 de Outubro

O duplo sonho da cidade

A tese da inexistência da cidade da cidade-sonho de Qarshi foi arrebatadoramente refutada. Mas não o foi [como seria de se esperar] por algum rato de biblioteca manejando alguma tese doutoral e sim por banais [porém muito mais efetivas] decisões do Subcomitê de Diversões e Entretenimentos Socialmente Úteis e não Socialmente Úteis do Partido, o qual decidiu, em modorrenta e empoeirada tarde de hoje em 1951 instalar por lá estúdios de cinema, a Ruliúde amhitariana.

[O modorrenta e empeirada talvez explique por que o primeiro surto de cinema amhitariano foi o Western (celebrado a 18 de agosto e imitado, é claro, mas ainda assim bangue-bangue) no qual sobram os duelos em tardes exatamente assim].

Dizem os revisionistas históricos que Qarshi [a cidade] sempre foi um sonho, e para provar sua [discutível] assertiva empilham manuscritos de andarilhos dos séculos II ou XVII, e o fato de nenhum ser sustentado em cacos de porcelana ou tijolos velhos de arqueólogos não os impede, é claro, de bradá-las.

E sua principal tese não vem do chão mas da doce poetisa Iroshka Maruf, a qual [em um raro poema na qual falava de algo que não sua família, seu gato e seu amante imaginário] escreveu que

As melhores cidades / como os melhores amores / são aquelas que não existem.
Eu sonho com Qarshi / cidade-do-meu-sonho / que foi e será / sempre.

e que como todo bom poema serve de argumento, sem importância a essa bobice que denominam realidade.

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